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A atual temporada de “Malhação” deveria parar de tratar de assuntos sérios enquanto é tempo

Faz umas duas semanas que comentamos aqui sobre uma gafe que a atual temporada de “Malhação” tinha cometido, e eles já conseguiram construir novos equívocos. Caso você não tenha lido, há pouco mais de duas semanas, “Malhação” entrou em uma polêmica grande que foi parar até no Buzzfeed depois que, em uma cena com Joana (Aline Dias), Giovanni diz que gostaria de ver a namorada gorda para que “os caras parassem de chegar nela”. A colocação não pegou nada bem e a cena foi crucificada em sites especializados e nas redes sociais – com razão.

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Pouco tempo do acontecido se passa e, na história escrita por Emanuel Jacobina, Joana e Bárbara (Bárbara França) entram para uma agência de modelos cujo dono é, pra dizer o mínimo, controverso. Na verdade o cara é um escrotão que não faz a mínima questão de disfarçar suas reais intenções. Logo no começo do concurso pro qual ele agencia as meninas você já percebe que o que ele quer é pegar as modelos e não fazer com que a carreira delas vá longe. Quer dizer, ele até quer que a carreira delas vá longe, desde que ele consiga pegar elas.

A coisa é mostrada com tão pouca sutileza que parece aquelas historinhas que passavam no antigo programa da Márcia antes de um caso ser mostrada no palco. Enfim, mas a coisa piora. O tal do Garcez (o dono da agência) se torna uma espécia de vilão louco que só criou uma agência de modelos para poder abusar das meninas. Sendo assim ele arma uma situação para que Giovanni pegue Joana com um outro modelo, tenha uma crise de ciúmes e termine com ela. O plano funciona, o namoro de fato termina, mas Joana é esperta e percebe que o patrão armou aquilo tudo porque tinha outras intenções com ela. Mocinha que não leva desaforo pra casa, ela desiste da agência se, pra isso, tiver que se envolver com Garcez.

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Enquanto isso, Bárbara quer se mostrar superior à irmã e finge dar uma brecha pro dono da agência pra conseguir subir na profissão de modelo. No outro dia o dono da agência já marca para Bárbara um suposto ensaio em uma revista francesa mas, ao chegar lá, ela percebe que não tem ensaio nenhum. Só tem Garcez, taças de champanhe e uma cena de abuso que terminou ontem, quando Garcez diz à Bárbara que ela não vai sair dali sem dar o que ele quer.

Vamos aos fatos: tratar abuso e assédio sexual em uma novela para o público jovem é uma atitude louvável. É o tipo de merchan social que até precisa acontecer porque essas coisas estão aí na vida de nós mulheres o tempo todo. Mostrar que isso ocorre majoritariamente em situações em que o cara está em uma posição de poder sobre a menina em questão é ainda mais legal. Agora, tratar o abusador como se fosse um vilão da Disney, e não uma pessoa normal, como é o que acontece sempre, já é ruim. Piora muito quando se coloca Bárbara em uma posição da mulher que “aceita” o assédio pra conseguir o que quer. O que vai acontecer é que a menina vai se enfiar numa situação em que não queria estar e vai ser julgada como uma pessoa que provocou. Tanto pelo abusador quanto pelas outras pessoas. Até aí ok, nada de novo sob o sol, é o que de fato acontece.

Só que o modo como a menina tratou a situação abre brecha para que o público ache que abuso só acontece com mulheres que provocam. Joana, esperta, boa e reta não cedeu às investidas de Garcez e, por isso, não sofreu nenhum mal. Bárbara, que flertou com o dono da agência e deu uma certa abertura se colocou nessa posição de perigo porque quis e, portanto, abriu uma brecha para que o abuso acontecesse. Isso dá uma ideia completamente errada do que de fato acontece e abre um precedente perigoso: o de que as mulheres só são abusadas porque “dão abertura”.

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Por mais que nos próximos dias a novela tente retratar que Bárbara,  mesmo tendo aceito o convite não deveria ser forçada a nada – porque não é não, aprendam isso – a mensagem equivocada já foi mostrada. Não seria muito melhor e muito mais realista mostrar Garcez como um cara que parece legal, que é visto por todos como um cara legal  – inclusive por Joana, a mocinha – e que começa a ter atitudes suspeitas usando seu poder o que faz com que Joana se sinta acoada e aí mostrar uma situação de abuso? Porque é assim que acontece. Abusadores, assediadores, na maioria das vezes, não são vilões da Disney que se mostram péssimas pessoas desde o começo. São gente que parece ok, justa e reta. O chefe, o dono de uma agência. E os casos não acontecem com as meninas que “dão abertura”, podem acontecer com qualquer uma.

E mais: nem todas as meninas tem a força de Joana que sai enfiando o pé na porta e mostrando que não quer nada com ele. Os jogos de poder são mais sutis. Sutileza é o que segue faltando na novela e que acaba por jogar por terra qualquer tentativa de conscientização. Foi a mesma coisa com a tentativa de tratar racismo. Se carregou tanto nas tintas que parecia que racismo só era praticado por gente maluca e má, quando atitudes racistas acontecem o tempo todo, inclusive por gente que parece bem legal.

Pra piorar mais ainda a situação, pra se vingar de Garcez, Bárbara e Joana se unirão e darão um banho de tinta no moço. “Pra mostrar como ele é sujo”. Sério mesmo que agora uma coisa séria como assédio é vingada com um banho de lama e tinta e não com denúncia, punição séria e etc? Não é uma brincadeira. Não pode ser tratado como brincadeira.

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O que mais nos preocupa agora é o jeito como a novela enxerga essas situações. São tantos equívocos tão frequentes que a gente fica se perguntando se não seria essa a posição dos autores. Se for pra tratar assuntos tão delicados com a profundidade de um pires, é melhor nem tocar neles. Que siga o triângulo amoroso entre irmãos no núcleo adulto e infantil, namoros, jogos de vôlei e qualquer amenidade dessas. Pra tratar de assuntos sérios, é preciso seriedade e comprometimento. E isso, essa temporada de “Malhação” já provou há tempos que não tem.

 

Larissa Martins

Fala muita bobagem, escreve sobre quase qualquer coisa e sabe tudo sobre a temporada da vagabanda de malhação.

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12 Resultados

  1. Biel disse:

    Credo, desde que essa geração começou lá em agosto de 2015, vocês não se cansam de falar mal. As situações patéticas que envolviam as temporadas de 2012 e 2014 eram uma maravilha, né não?

  2. Leandro disse:

    Mimimi politicamente corretos. Depois só ficam com magros, brancos e padrão. Bando de hipócritas

  3. Felipe disse:

    História xerocada, mocinha e vilã que se descobrem irmãs uma da outra, e até o cara abusador é o mesmo da temporada de 2010,O Rique que assediou também as irmãs Raquel e Catarina e essa temporada também era do Emanuel Jacobina

    • Jessica Oliveira disse:

      Cadê a criatividade do cara?
      Por isso q falo, das novelas que passam agora a melhor é rock story pq essa malhação é dificil de ver viu
      Assisto as vezes, mas não me importo se perder um capitulo kkkk.

  4. Yuri Neves disse:

    Na verdade, Larissa, falta uma Malhação que una todas as tribos. Como foi a Vagabanda

  5. Rafa disse:

    Talvez a inserção desses merchans porcos seja apenas uma preparação pra temporada do Cao Hamburger, se preparem!

    Eu acho que a parte da vingança do abuso com Tinta feat. Lama kkk tem muito a ver com a faixa etária que a novela está direcionada, li por ai que a novela é direcionada pra pré adolescentes de 10-13/15 anos e explica um pouco o fato do autor nao poder mostrar a vida como ela é.

    Lembro que quando o Hoffstetter quis botar um plot de um cara envolvido com crack amigo do Fiuk na temporada ID enfrentou uma puta resistência na propria emissora aliada com a classificação indicativa que tese viu obrigado a mexer nos dialogos , situações….Volta tempos de Malhação 90-2000 onde se falava sobre qualquer coisa sem qualquer pudor..Desde 2007 reorientaram a trama pra agradar pré adolescentes e virou está bosta que tá no ar até hoje

    • Malu disse:

      SOS eu lembro do plot do crack na malhação id, haha. Acho que o problema é: se não pode fazer direito, pela faixa etária, horário, etc, não faça. Foca em triângulo amoroso e tal. Apesar de que eu não acho de jeito nenhum que seja impossível tratar assuntos como racismo e assédio de forma real, tratando com a seriedade necessária e sem ficar pesado. Pra mim, isso é incompetência do Jacobina mesmo, falta sutileza.

    • Jessica Oliveira disse:

      Mas não acabaram com a sensura?
      Afinal a tal da classificaçao indicativa não passava de uma sensura disfarçada?
      Portanto.

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