Os artistas brasileiros que podiam ter tirado o Nobel de Bob Dylan

Ontem um assunto que deu o que falar na internet foi o Nobel de Literatura dado pro Bob Dylan. Muita gente concordou, muita gente achou horroroso porque tem tanto escritor bom na fila que não ganhou e etc etc. Antes que você ache que a gente começou a dar pitaco em literatura pra complementar a renda, a gente já pode te tranquilizar dizendo que não, nosso único compromisso segue sendo com piada mesmo. Sendo assim, pensamos: se o Bob Dylan pode ganhar o Nobel de Literatura “por ter criado uma nova expressão poética dentro da grande tradição americana da canção” por que não pensar quais artistas que se aventuraram como cantores nesse Brasilzão não podiam fazer o mesmo? Sendo assim, a gente sentou aqui na mesa da redação e, bebericando um café e ouvindo um Bob Dylan pensamos: quais os artistas brasileiros que podiam ter ganho o Nobel no lugar do Bob Dylan? O resultado você confere aqui embaixo.

Gilberto Barros:

Quem é? Apresentador de TV que ficou famoso apresentando programas na Band e na Record que misturavam games, presença de famosos, quizes e a participação do grupo Kasino, como qualquer programa do fim dos anos 90 começo dos anos 2000 que se preze.

O que fez de bom para as artes? Lançou o álbum “Acorrentado em Você” no qual nos brindou com canções inéditas e releituras de canções clássicas com um toque Gilberto Barros de ser.

Sua obra prima: A canção “Acorrentado em Você” que faz um paralelo entre as amarras do amor romântico que, ao mesmo tempo que faz o sujeito abrir mão da própria liberdade, faz com que ele se sinta tentado a permanecer naquela prisão que é o amor puro e simples. Um importante trecho da canção demonstra bem essa dualidade típica do amor em si: “Acorrentado em você/ Estou me sentindo acorrentado/ Morrendo de tanto te querer/Coisa de quem está apaixonado/Acorrentado em você/Estou me sentindo acorrentado/Louco pra fugir dessa prisão/Só querendo ficar do seu lado”. Seria Gilberto Barros o Camões da nova geração? É uma possibilidade.

Por que merece o Nobel? Porque se Bob Dylan criou uma nova expressão poética dentro da tradição americana da canção, Gilberto Barros com certeza criou uma expressão poética dentro da tradição brasileira do programa de auditório, fazendo com que o povo, muito mais do que esquecer do cotidiano complicado durante tardes e noites de descanso, também conseguisse ter acesso à expressões artísticas de qualidade como é o caso de “Acorrentado em Você” ou até mesmo canções mais simples como “A Árvore da Montanha” (ôe iaô), que não deixa de ser uma volta ao lúdico.

Ana Maria Braga:

Quem é? Apresentadora brasileira que está no ar em programas dedicados ao público feminino antes mesmo que você se lembre que esses programas existiam.

O que fez de bom para as artes? Apesar de ter se aventurado um pouco no mundo da literatura, sua grande obra está mesmo dentro de seu álbum “Sou Eu” em que suscita questões importante sobre o papel da mulher na sociedade.

Sua obra prima: A canção “Sou Eu”, que traz uma boa reflexão sobre o papel da mulher. Quem é a mulher na sociedade? Ela pode ser ela mesma ou tem que assumir papéis para fazer o que os outros esperam dela? Em uma dada hora Ana Maria reflete: “No espelho uma menina/Brincando de esconder/Se mostra e ri pra mim quando me vê”. Esse trecho claramente fala sobre o quanto a mulher tem que se privar de ser o que ela quiser pela pressão que ainda sente na sociedade: no espelho ela vê tudo aquilo que ela realmente é, mas sabe que muita coisa ela tem que deixar calada, escondida porque ainda se sente muito oprimida. Logo depois, a artista reflete sobre sua essência, sobre aquilo que sempre esteve ali; o imutável: “Sou eu, ha, eu sempre fui assim/Sou eu/Euzinha”. E Ana Maria nos mostra que tem o direito de ser mulher e ser o que realmente é. Ela é. Eu Sou, ela diz. E é.

Por que merece o Nobel? Porque criou uma expressão poética dentro do universo do programa de variedades voltado para o público feminino; emponderada, mostrou tudo que uma mulher pode fazer: ser mãe, mulher, apresentadora, artista. Ana ainda nos brindou com a obra prima que é o álbum “Sou Eu” mostrando que não tem problema algum ser a mulher que assume vários papéis dentro da sociedade e assim nos mostra que o lugar dela é onde ela quiser. Mesmo assim, ela ainda mantém a sua essência sendo assim: “euzinha” (sic). Ana Maria é para o Brasil uma espécie de Simone de Beauvoir que ainda assa bolos.

Celso Portiolli:

Quem é: Apresentador de programa de variedades que pode ser que você nem saiba que continua na TV, mas continua sim.

O que fez de bom para as artes? Fora apresentar alguns programas que testavam o conhecimento do jovem brasileiro, questionou o avanço das tecnologias em sua grande obra “Amizades Virtuais”.

Sua obra prima: A canção “Amizades Virtuais” que faz um grande estudo sobre o os relacionamentos depois do advento da tecnologia. Nesta canção Portiolli diz que tem muitas “amizades virtuais”, mas até que ponto uma amizade virtual é mesmo uma amizade de fato? Em um momento da canção o autor se questiona: “Eu tenho muitas amizades virtuais/ Eu bato papo pelo meu computador/O meu correio eletrônico é demais/Em um minuto meu e-mail já chegou”. É nesse momento que vem a dúvida: em um minuto o e-mail já chegou, mas e as relações? Elas se constroem em um minuto? Por que é tudo tão rápido? São questões que Celso aborda.

Por que merece o Nobel? Porque é um artista que se arrisca. Quando ainda ninguém falava sobre o bate papo de computador, ele abordou a questão, questionou e ainda falou sobre globalização. Em sua principal obra, Portiolli se espanta “só falta o computador falar”. Seria isso? Será que estamos colocados em um ambiente tecnológico tão feroz e frio que daqui a pouco deixaremos de ter relações com as pessoas para nos comunicar pela tela e para a tela? O computador que fala é uma imagem forte. Celso criou uma expressão poética dentro de um universo ainda limitado que é o da canção que fala sobre os avanços tecnológicos. Um Bauman que se expressa através da música? Podemos dizer que sim.

Augusto Liberato (Gugu):

Quem é: Apresentador de vanguarda de programas vespertinos que soube brincar com a arte em canções & disfarces.

O que fez de bom para as artes? Se fantasiou, se despiu de toda vaidade, dançou, cantou e deu ponto para as meninas quando era preciso.

Sua obra prima: Apesar de Gugu ser muito conhecido por sua canção “Pintinho Amarelinho”, os críticos consideram a grande obra de Augusto Liberato a canção “Táxi do Gugu” que fala sobre os disfarces que temos que tomar na vida se quisermos ser felizes. O que é uma canção de dúvida é também uma canção de esperança porque o Táxi, que é uma clara metáfora sobre a vida em que o taxímetro não para de rodar, pode te levar para um lugar inesperado onde todas as suas perspectivas e a forma de encarar o mundo podem mudar.  O momento mais marcante da música fala sobre as mudanças que chegam de uma hora pra outra, sem avisar: “Chegou a hora, venha comigo/ Vem que nosso táxi nunca pode parar/ Sou seu amigo, não tem perigo / Vem que a sua vida hoje pode mudar”. O importante é não deixar nunca de caminhar. O taxímetro (metáfora clara sobre o tempo) não para de rodar. O que Gugu quer nos dizer é isso: a vida não para.

Por que merece ganhar o Nobel? Porque criou uma expressão poética dentro do universo do domingo na TV brasileira e ainda rompeu barreiras ao se arriscar como letrista, cantor e por dançar lado a lado com um boneco vestido de pintinho amarelinho. Seria o gavião de quem o pintinho amarelinho tem tanto medo a representação do medo da morte que vive em todos nós? Essa é apenas uma das interpretações. Seria Gugu um Sartre que se disfarçou de animador de auditório para que nos déssemos conta da finitude da vida? Talvez.

Roberto Justus:

Quem é: Empresário? Apresentador? Amante de famosas? Roberto Justus é um artista com muitas facetas.

O que fez de bom para as artes? Criou uma expressão poética dentro da interpretação das canções de Frank Sinatra.

Sua obra prima: Roberto é um interprete, mas um interprete que transcende. Quem vê de longe pode pensar que sua arte se resume apenas em cantar canções consagradas, mas o que transcende a sua arte é a dualidade. Seria a música um simples negócio?, nos faz pensar Justus. O que significa às artes um grande empresário interpretando grandes canções? Teria a música virado um negócio? Sua obra prima são as várias dúvidas que sua carreira de cantor por si só suscita em quem o ouve.

Por que merece o Nobel? Por criar uma expressão poética que transcende a própria música, a literatura, a arte em si e já é totalmente outra coisa. O quê? Também não sabemos.

Susana Vieira:

Quem é: Cantora, atriz, amada por milhões de brasileiros e podia ter um programa.

O que fez de bom para as artes: Quebrou paradigmas, explorou seu corpo, a nudez, sua voz e criou uma nova expressão poética dentro do mundo da TV.

Sua obra prima: O próprio existir de Susana Vieira pode ser em si mesmo, uma obra prima.

Por que merece ganhar o Nobel? Se uma pessoa não merecer ganhar o Nobel da Paz por unir milhões de brasileiros (fora um ou dois) em torno dessa obra prima em forma de vídeo, sinceramente não sabemos o que merece: